sábado, 3 de março de 2012

O MOÇO DO HI FI

Foto arquivo 2012



17 DE OUTUBRO 2010

Flor olhava de canto, disfarçadamente, talvez por ter tanto medo de que seus olhos pudessem se inundar, e fingiu que não o estava vendo. Essa sempre foi à maneira mais covarde de fugir de alguém, escapando de seus olhos.
Pegou a caneta e o papel da bolsa e fingia anotar algo, sendo essa a maneira mais patética de se ganhar tempo.
Enquanto fingia que escrevia, ele virou-se furtivamente e encarou por uma fração de segundos. Batia seus olhos nele, como se houvessem atirado pedras. Doeu da mesma forma.
A caneta caiu, o rosto dele também. Pegou rapidamente a caneta, tão rápido quanto ele ao consertar sua postura. Ele ficou novamente de frente para o moço, então o fitou, com uma coragem precoce assustada com sua audácia. Sentiram um gosto cru na boca, os lábios ressecados de carência. O peso nos olhos também atrapalhava, mas mantivera firmes, presos a ele como uma criança que gruda nos braços da mãe.
Ele, como o bom covarde que sempre foi, desviou os olhos e andou até a calçada que ainda o sustentava.
Suas pernas vacilaram, trêmulas, bêbadas. As reprimiu. O moço continuava vindo, os olhos grudados no caminho. Então chegou mais perto, bem perto, tão perto. E mudou de calçada.
Seus olhos arderam em chamas, sentia as gotas de lágrimas brigando dentro de si, loucas para serem libertadas. As reprimiu, também.
Levantou com a dor que consumia, agora, todo o resto. Conseguia dar os passos necessários, as pernas eram mais leves que o coração. Pegou a caneta e o papel, que também não pesavam tanto, guardou-os na bolsa e mais uma vez foi, dessa vez sem olhar para trás, sentindo na ponta da língua o gosto ácido, que já escorria por todo o seu rosto pousando na manga esquerda da blusa, pertinho daquilo que ele costumava chamar de meu coração.







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